domingo, 7 de junho de 2009

Jack London: ‘O varejo vai mudar com a tecnologia’

Confiram esta excelente entrevista om Jack London, sobre como os novos caminhos da informação irão influenciar o modo de vender e aparecer no mercado.
Essa entrevista está publicada no site da Tribuna do Norte, link aqui


Economista, empresário e escritor, Jack London foi o primeiro a entrar no e-commerce no Brasil criando o site Booknet. Sua frase mais famosa - “No século 21 a ignorância será uma opção e não mais uma condenação” - traduz bem o clima de seu palestra durante a 13ª Convenção do Comércio e Serviços do Rio Grande do Norte, realizada semana passada em Natal. Com bom humor, o palestrante trouxe para a plateia de empresários as expectativas do comércio eletrônico para os próximos anos e apresentou formas de como o varejo poderá se utilizar (e já se utiliza) de recursos que a internet oferece. Um exemplo disso é o Twitter, sistema de micro-blogging, que já é utilizado por diversas empresas para divulgar promoções e produtos. Para London, o comércio tradicional como ele existe hoje vai mudar. As lojas vão acabar? Não. Mas quem não entender que este é um momento de transformação da forma de vender está fadado a sumir. E não só o varejo será afetado pela tecnologia que avança cada vez mais rápido: a política, a educação. Telefone fixo, aparelho de fax, CDs e DVDs são exemplos de instrumentos citados por ele que desapareceram ou vão desaparecer com a evolução de novos meios tecnológicos. Nessa entrevista à TRIBUNA DO NORTE, Jack London fala sobre o panorama mundial da internet e como ela vai revolucionar cada vez mais a vida dos consumidores e empresários.

No momento em que se fala o tempo todo em crise econômica, com a revolução tecnológica o comércio tradicional também entra em crise?

Eu acho que essa crise que estamos vivendo tem dois lados. A gente percebe isso com a forma dos chineses se expressarem: o ideograma deles para a palavra crise é “caos” mais “oportunidade”. Ou seja, toda crise desse tamanho também traz muitas oportunidades. A gente sempre vive crises, vamos viver, a vida é assim. Mas as oportunidades que nascem depois delas são muito grandes. E acho que uma das oportunidades que temos agora é repensar a nossa maneira de ver o mundo e como a gente organiza o mundo dos bens e serviços. Estávamos chegando no limite da depredação de meio ambiente, da incapacidade de compreendermos e imaginarmos a continuidade. Uma economia eminentemente baseada no crescimento é um ideia absolutamente destrutiva. Não pode haver crescimento permanente, ilimitado. Então, nessa retomada da economia, a a utilização dos meios tecnológicos vai ser vital. Você vai ver cada meio sendo usado. O comércio eletrônico vai crescer muito e a utilização dos equipamentos será cada vez maior. Gente que mesmo hoje estava fora do comércio eletrônico, na hora que essa crise começar a se transformar em oportunidade vai verificar que a maneira como trabalha, como aborda o mundo, vai precisar cada vez mais dos meios eletrônicos.

Mas então as lojas físicas como conhecemos hoje e os centros de consumo como os shoppings estão fadados a acabar?

Não. Não vão acabar, não. Eu sustento a tese de que nada vai acabar. Por exemplo, o teatro. Até o começo do século 19, nenhuma pessoa saía de casa no Brasil para se divertir se não fosse para ir ao teatro. Você pega as estatísticas e vê que 100% dos brasileiros, principalmente nas grandes cidades, saíam de casa para ir ao teatro. Por quê? Porque só havia o teatro. Aí veio o cinema, a primeira tecnologia industrial. Muita gente disse o seguinte: “Quando o cinema se impuser, o teatro acaba”. O teatro não acabou. Mas ele mudou. Ele se tornou uma forma de entretenimento marginal. No Brasil hoje, por exemplo, menos de 0,5% das pessoas que saem de casa para se entreter vão ao teatro. Mas o teatro acabou? De jeito nenhum. Mas é o mesmo que era antes? Não é mais. Vamos dar exemplos de algumas coisas que já impactaram no comércio. Vou citar um modelo de comércio que são as lojas de linha branca. No Rio de Janeiro e São Paulo, temos a Lojas Americanas. Como era o modelo delas antes da internet? Era sinônimo de grandes lojas, de 2 mil, 2,5 mil, 3 mil metros quadrados, com milhares de mercadorias lá dentro. A Lojas Americanas não abre uma unidade desse tamanho há dois anos. Eles agora criaram um modelo que se chama Americanas Express, que já tem em Recife. É uma loja de 400 metros com uma placa enorme na parede dizendo: “200 mil produtos você encontra no nosso site na internet”. E aí a loja tem uma bateria de computadores para você comprar esses 200 mil produtos. Acabou o modelo da Lojas Americanas? Acabou a Lojas Americanas? Não. Mas é outra, mudou. 30% das vendas são feitas pela internet.

Quem não mudar então está fadado a sumir?

Sim. Os shoppings que você perguntou. Eles vão ser cada vez mais entretenimento e alimentação. Entretenimento de qualidade. Os cinemas atuais também vão todos morrer porque só existirão salas 3-D. Hoje temos condição de produzir uma imagem de tela grande em casa, mas ainda não temos 3-D. Lojas de produtos serão cada vez menos. Esse fenômeno a gente já vê em Rio de Janeiro e São Paulo. Há vários shoppings que passaram de lugares de lojas para áreas de entretenimento e alimentação. A única coisa que a internet não mexe hoje é a alimentação. Isso porque ainda não dá para gente comer virtualmente. Mas qualquer dia alguém descobre como é que faz isso.

O senhor cita grandes centros como o Rio de Janeiro e São Paulo. Mas no Brasil como um todo o comércio eletrônico já é uma ferramenta bem difundida?

Sim, com certeza. Existe um site chamado E-bit que dá as estatísticas de comércio eletrônico do Brasil inteiro. Existem alguns itens em que 60% das vendas já são feitas pela internet. Sabe quais são as cidades que mais compram hoje pela internet? Não são as grandes. São as médias. Campinas (SP), por exemplo, é campeã brasileira de compras pela internet. Mas isso é fácil explicar: o morador de classe média para alta, instruído, com recursos. Mas o comércio de Campinas não tem a mesma qualidade de produtos que o comércio de São Paulo, capital. Então aquele cidadão tem o mesmo padrão de consumo da capital, mas não tem o produto para consumir ali. Ele então vai buscar o que procura na internet. Campina Grande, na Paraíba, tem um índice enorme de compras pela internet. Brasília é uma coisa impressionante (em matéria de comércio eletrônico). É curioso isso. E esse hábito está se espalhando pelo país.

Essa é uma tendência mundial. Mas quais vantagens do comércio eletrônico hoje tanto para quem compra quanto para quem vende?

Para quem vende é uma redução de custos monumental. Quando a gente fala em comércio eletrônico a gente sempre fica na cabeça com a ideia de calças, camisas, relógios, produtos. Mas o setor que mais utilizou a internet no Brasil foi o setor bancário. São transações eletrônicas comerciais. Sabe quanto do movimento bancário do brasileiro hoje é feito pela internet? 78%! Os bancos mudaram suas vidas e de seus clientes. Aquela coisa da ação presencial no banco está se acabando. Cada vez mais as pessoas vão menos ao banco, os bancos são cada vez menores, são cada vez menos agências de bancos. E o estímulo que o banco te dá para que seja utilizada a internet ajuda nessa mudança de perfil. Há produtos que, se você fizer a transação pela rede, a taxa que você paga é metade da que você teria. Os bancos reduziram a quantidade de funcionários. Eram 600 mil bancários e hoje são 405 mil.

Em sua palestra durante a 13ª Convenção do Comércio e Serviços, o senhor citou algumas ferramentas bem atuais da tecnologia como é o caso do Twitter. Como uma empresa varejista pode se utilizar de um meio como esse hoje?

É muito simples. É só entrar no site, se cadastrar e começar a fazer ofertas na rede pelo Twitter, por exemplo. Descrever o funcionamento da loja, inserir ofertas. Ao invés de inserir suas notícias pessoais, você insere as notícias da loja.Existem exemplos desse uso do Twitter aqui no Brasil e que esteja sendo bem sucedido?Sim. Temos vários que têm funcionado muito bem. Grandes jornais já estão todos no Twitter, as revistas, alguns magazines. Se não me engano, o Ponto Frio já está no Twitter. Acaba virando uma coisa comercial. Você cria lá o perfil: “Este é o Twitter do Ponto Frio” e coloca: “Nas próximas duas horas, nas lojas de não-sei-onde vai ter um desconto de 70% nos produtos. Tem que dizer que entrou no Twitter”. Pronto e aí, vai...

Então as empresas vão cada vez mais utilizar esses serviços para se beneficiar e crescer?

Sim. Daqui há dez anos, não haverá política sem internet. A próxima eleição já será altamente influenciada pelo uso da internet. O exemplo do (Barack) Obama está se espalhando pelo mundo inteiro (Durante a eleição presidencial nos Estados Unidos, o atual presidente utilizou o Twitter como uma de suas ferramentas do pleito não só para que os eleitores o “seguissem” no site, mas também para arrecadar fundos para sua campanha). A capilaridade que a internet permite em termos de adesão, em termos de coordenar as coisas é enorme. Hoje se pode fazer um comício pela internet para um bilhão de pessoas.

Essa tecnologia e mudanças são positivas na sua opinião para o comércio?Acredito que são muito positivas, sim. Elas cada vez trazem mais bolsões de pessoas para participar do consumo. O que era o comércio no Brasil há 20 anos?

Era um comércio de elite só. Apenas uma alta camada da população comprava. O que era a educação há 20 anos? O que era a política? E por aí vai. A tecnologia no caso ela é mero instrumento. Ela não muda nem a política, nem as ideias nem a forma de governar. Há quem ache por exemplo que a política termina com a corrupção. A gente vê isso nos jornais o tempo todo. Ela não termina com a corrupção. A corrupção é do ser humano. É como a internet que também pode ser um instrumento para combatê-la. É o exemplo de ONGs que mantém sites como o Contas Abertas. Quando que um cidadão ia ter acesso a uma informação daquelas? Quero saber quanto o governo do Amazonas gastou no último ano com estradas: ele coloca na tela em um instante como informação. E o que é isso como instrumento de pressão política?

Mas essa tese de que a internet permite um acesso maior da população às informações, não se torna falha quando a gente sabe que poucos lares brasileiros estão ligados à rede hoje?

Essa frase também está ficando antiga. O acesso maciço da internet não será mais por essas maquininhas que estão em nossos lares. Será por outra que carregamos no bolso (celular). Praticamente todos os brasileiros têm celular, todos! É normal. Em Portugal, cada cidadão tem dois aparelhos, em média. Na Coréia do Sul, são três. Agora daqui há três anos, o aparelho celular que eu carrego vai virar lixo. Como já virou na Coréia, como já virou em Portugal. E os celulares no futuro sairão de fábrica com acesso à internet.

O senhor não acha que as pessoas acabam perdendo sua privacidade no meio de tanta tecnologia?

Sim, perde. Se você quer conhecer mais, ao mesmo tempo você precisa ser mais conhecido. As pessoas têm que saber quem você é. Não adianta mentir e dizer que não perde privacidade com esse mundo digital.

Mas com isso o senhor acha que mais à frente as pessoas podem ter uma tendência de retorno para buscar mais privacidade?

Sim, claro. Podem haver grandes dificuldades. Mas isso acontece cada vez que você lida com tecnologia. Você sabe mais que seu pai; seu pai sabe mais do que sabia seu avô. É um caminho.

Fonte: Vinícius Albuquerque-Tribuna do Norte