segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Você quer ser o líder mais legal ou ser o melhor?

Como você quer ser lembrado pelas pessoas que trabalharam com você? Como o líder mais legal que elas tiveram ou o melhor líder, aquele que transformou carreiras, desenvolveu novas lideranças, atingiu os melhores resultados? A decisão é sua!


Voltando um pouco no tempo, eu comecei cedo a minha batalha, aos 16 já tinha uma carreira, na minha visão, bem sucedida, como vendedor em uma empresa de revestimento e decoração e lá tive o chefe mais exigente e também o que mais me ensinou, o meu pai.

Uma breve retrospectiva: meu pai era um engenheiro sem diploma, que abandonou a faculdade no terceiro ano para empreender, logo aos dezoito já tinha aberto sua primeira empresa e contratou meu avô para trabalhar com ele. Atingiu o sucesso e quebrou algumas vezes, mas sempre nos proporcionou uma vida boa, sem excessos. Meu pai era o exemplo perfeito da meritocracia e aplicava isso de maneira impecável dentro de casa, se queria sair com amigos, tinha que fazer o dever de casa, se queria viajar, tinha que passar de ano, se queria uma bicicleta de natal, as notas tinham que ser superiores a 9. Não brigar com a irmã ou arrumar a cama de manhã valiam pontos extras. Nada de bom era alcançado sem uma contrapartida, um esforço, ou seja, sem merecimento.

Esse DNA empreendedor me pegou e aos 17 eu já tinha fundado a minha própria empresa, uma confecção especializada em moda íntima. Estamos falando da primeira metade dos anos 90, não existia o glamour de jovem CEO ou do "founder" que existe nos dias de hoje. Empreender no Brasil, atualmente, é difícil, mas quem empreendia naquela época era insano mesmo, na minha idade todos desejavam mesmo um estagio em uma grande multinacional (que veio mais tarde, mas esta é uma outra história).

O maior legado desta primeira experiência como líder foi perceber que nem tudo precisa ser do meu jeito, existem diferentes caminhos para se atingir o mesmo objetivo e todos podem estar corretos. Você só precisa definir qual o melhor para você e sua equipe percorrer. Essa decisão nem sempre é simples, porque pode não ser o mais curto, nem o mais barato, o líder deve analisar qual o melhor e isso envolve entender qual time está lhe acompanhando e qual o momento de sua empresa.

Essa base foi fundamental para que eu pudesse adquirir uma habilidade importante para um profissional da área que é o "entender ou ler pessoas". Pra ser mais claro, parece natural pra mim entender as habilidades, intenções, anseios, desejos das pessoas que me cercam e isso faz com que seja mais simples me relacionar, motivar e buscar o que há de melhor dentro delas. Me dá muito prazer ver o desenvolvimento de profissionais ao meu lado, muitos deles se tornando melhores do que eu.

Fazer um profissional crescer não é uma tarefa simples e você não consegue fazer isso só dizendo o que o outro quer ouvir, muitas vezes é preciso ser pai, outras vezes irmão e algumas vezes padrasto. Ver o desenvolvimento de alguém significa que você vai vê-lo rindo, mas também chorando algumas vezes e vai ter que saber a hora de passar a mão na cabeça ou deixá-lo sozinho "de castigo" refletindo sobre o que fez.

O importante é orientar e deixar muito claro que, apesar de ele nunca estar sozinho e que o líder está ao lado para proporcionar os melhores recursos, ambiente e informação, sem o próprio esforço ninguém vai carregá-lo até o sucesso.

Eu não acredito que o papel do líder é ser o melhor amigo das pessoas da equipe, e essa não deve ser mesmo a maior preocupação. Não deve ter medo de magoar ou ferir sentimentos das pessoas quando fizer uma avaliação ou expressar a verdade. Já quis "matar" alguns líderes que tive, em determinados momentos, mas pude entender mais à frente que eles estavam corretos e eu não. O líder "amigão" não faz bem à equipe, eu, pessoalmente, nunca gostei, me soa falso. Esse é o tipo que forma uma turma de alienados e dependentes, sem confiança e autonomia, que serão mal formados e passarão essa cultura adiante. É possível identificar em toda empresa esses profissionais, mais preocupados em ser querido do que entregar uma boa performance. Isso não é bom para o líder, não é bom para a equipe e não é nada bom para a companhia.

Eu acredito em um ambiente de trabalho aberto, transparente, onde haja confiança mútua, com respeito, bom humor, sem melindre, sem pessoas magoadas mais pela forma do que pelo conteúdo do discurso, sem um falso politicamente correto, em que temos pessoas cheias de "dedos" com as outras. Nestes ambientes as verdades só são faladas na "rádio corredor". É importante lermos mais Jack Welch e Vicente Falconi.

Welch, por exemplo, viaja o mundo conhecendo pessoas e empresas, diz que raras empresas tinham criado uma verdadeira cultura de feedback sinceros, agravada por uma era de ultrassensibilidades, em que marmanjo é capaz de ligar chorando para a mãe se o chefe é direto. Para Welch o trabalho de algumas pessoas normalmente estará abaixo da média, e até pessoas muito boas podem deixar a desejar em algumas tarefas, isso deve ser apontado claramente, mesmo que gere mal-estar no momento. A teoria sempre é mais fácil e é óbvio que uma cultura de transparência é mais fácil de implantar quando os colaboradores pelo menos simpatizam com o direcionamento da liderança. Isso evita muitos conflitos desnecessários.

Por outro lado a liderança deve colocar em prática o que é pregado no discurso, não adianta exigir atitude de dono e querer na verdade uma atitude COM o dono. Se você quer uma equipe independente, autônoma, produtiva e que se sinta dona do negócio, tem que estar preparado para debater e ouvir coisas que não quer. O importante é deixar sempre claro que qualquer discussão ou debate tenha como foco os processos e nunca as pessoas. Uma vez que a equipe entende isso, não existe mais sensibilidade aguçada, a transparência reina, os feedbacks são realizados constantemente e existência de um discurso na mesa e outro no corredor, tão nocivo para o ambiente e para a produtividade, deixa de ocorrer. Desta forma o resultado realmente aparece, bom para o acionista também.

O fato é que todo mundo perde quando abrimos mão da transparência para evitar magoar as pessoas. Uma pessoa com uma performance apenas regular, que não recebe feedback verdadeiro apenas porque ela é uma pessoa incrível, de bom coração e divertida, vai deixá-la na mesma rota por anos, não verá progresso na carreira. No futuro vai culpar a companhia, sociedade, preconceito ou azar por não ser bem sucedida. Que bem o líder fez a ela? Ele apenas escolheu o caminho mais fácil, pra ele!

Pra citar mais uma vez Welch, ele diz que “as empresas vencem quando elas sabem fazer uma diferenciação clara entre quem tem melhor performance e quem não tem, quando elas cultivam os bons e abatem os ruins. Companhias não devem tratar a todos igualmente. Em geral, você nem precisa demitir os menos adequados. Eles percebem e vão embora antes. Ninguém quer ficar em uma organização onde não é desejado”

Isso não é cruel, é apenas a busca pela verdadeira meritocracia. Algumas empresas cometem o erro de bradar pela meritocracia, mas acabam praticando o favorecimento e o paternalismo e isso fica muito claro para os colaboradores. A verdadeira cultura do mérito não enxerga nome ou cargo, o que se diz é mais importante do que QUEM diz e isso fica evidente para todos quando e como acontece, a equipe enxerga isso ao lado, é sentido por todos, não precisa muito esforço para divulgar.

Para o líder é muito importante manter a lógica e ter métricas coerentes ao longo do tempo. Não deve alterar repentinamente ou constantemente o que é importante e o que a empresa valoriza, pois acaba passando uma mensagem de que no fundo nada importa e apenas está escolhendo algo aleatório para implicar.

A equipe muitas vezes gosta de ter uma referencia sobre o que é bom ou quem está entregando uma boa performance. Deve se ter muito, mas muito cuidado com os exemplos, escolha bem e tenha certeza de que é realmente um bom exemplo, caso contrário você pode virar uma piada interna e perder sua credibilidade.

A coerência entre teoria e prática é vital para o bom ambiente e para uma companhia com alta produtividade (e resultado), sob pena de se criar um ambiente de falsa motivação em que se tem uma turma de colaboradores muito "legais", com performance medíocre e, naturalmente, as pessoas altamente produtivas, que trazem resultados e inovação, não se adaptarão.

Na busca pela excelência não dá pra ser sempre legal, mas quem luta pela excelência de todos sempre é o mais legal! Pense nisso!

Artigo de Gilberto Carvalho, Head of Marketing & Digital da BeOn marketing & growth (China)