Fachada da nova loja |
Talvez tenha sido justamente a cautela que ajudou a grife a chegar aos 88 anos como a marca que melhor sabe conjugar globalização com artesanato.
Fundada em 1925, em Roma, pelo casal Edoardo e Adele Fendi, como um negócio de peles e couros, a Fendi se destacou imediatamente como um rincão de excelência na escolha de matérias-primas. Absolutamente tudo era – e é – feito à mão, desobedecendo padrões estéticos do que se costumava considerar moda. Nos anos 1960, Edoardo e Adele começaram a passar a gestão às cinco filhas, Paola, Anna, Franca, Carla e Alda, fato raro num meio até então dominado por costureiros homens. Em 1965, o quinteto contratou em Paris um então novo talento da moda, o estilista alemão Karl Lagerfeld, para tirar a poeira de sua linha de roupas. Ele criou a logomarca dos dois F, transformou os pesados casacos de peles em peças mais modernas, para ser usadas como jaquetas, e lançou a primeira linha de prêt-à-porter de visons da história.
Assim como Lagerfeld, há 48 anos à frente das roupas da marca, é possível encontrar ainda hoje, nos ateliês romanos da Fendi, profissionais com o mesmo tempo de casa. Os fornecedores também continuam imutáveis – artesãos do eixo Roma-Florença –, sem nenhuma concessão da linha de produção a países asiáticos. A voracidade da expansão global e a sede dos mercados emergentes – são 190 lojas ao redor do mundo – parecem não ter afetado o ritmo da Fendi, ainda que a marca tenha sido comprada, na virada dos anos 2000, pelo grupo LVMH, maior holding de luxo do mundo. “Ainda conservamos esse ambiente familiar”, disse a ÉPOCA Silvia Fendi, filha de Anna e único membro da família ainda a trabalhar na empresa. “Depois da venda, a empresa se tornou maior, mais global e mais bem organizada, mas, no dia a dia, não sinto tanta diferença. Os funcionários se conhecem desde sempre, e os princípios para fazer o melhor produto continuam os mesmos de 1925.”
Ao deparar com Silvia, uma mulher baixa, discreta, elegantemente vestida num uniforme preto, o interlocutor não imagina que está diante de uma das maiores criadoras do sempre espalhafatoso universo da moda. Desde 1994, ela assina os acessórios da Fendi. Foi a responsável por detonar, em 1997, a febre mundial das it-bags, com a criação da bolsa baguette, uma bisnaga de couro que ganhou versões em seda, jeans, cristais e até diamantes. “Fiz a baguette porque senti necessidade de criar uma bolsa que fosse uma extensão da roupa e do corpo da mulher”, diz Silvia.
O estrondoso sucesso alçou a bolsa a um patamar até então jamais visto em escala global. Ela passou a ser a primeira aquisição de uma mulher no universo do luxo. Sua criadora diz que a criatura se voltou contra ela. “Até mesmo estilistas que nunca fizeram bolsas passaram a fazer. Um dia, deparei com uma cópia tão vulgar que me senti devorada por minha própria criação. Então passei a perseguir outro modelo mais sóbrio, discreto, funcional, que tivesse mesmo cara de bolsa. Ele só tomou forma dez anos depois, com a Peekaboo.” A nova bolsa acabou virando hit também. “É claro que é prazeroso ver seu trabalho reconhecido. Sempre que um designer alcança um sucesso absoluto, porém, ele tem de tomar coragem para ir rumo a uma direção completamente oposta. Um processo feito à mão e na contramão.”
Fonte: Época